NOVEMBRO, A PORTA DO INVERNO DE TODAS AS ERAS

NASCI EM NOVEMBRO QUANDO AS PRIMEIRAS NEVES SE ADENSAM NOS CUMES E AS ÁGUAS SEM DONO CORREM  COM A FORÇA QUE ANUNCIA AS GRANDES CHUVADAS.

NOVEMBRO, MÊS DOS MAGUSTOS NOS LARES E NAS EIRAS. O CHEIRO BOM DAS CASTANHAS A ESTURGIR NAS BRASAS E O AR ADOÇADO PELO PERFUME LICOROSO DO VINHO DOCE E DA GINJA.

NASCI EXTRAÍDO DO LÍQUIDO QUENTE DO ÚTERO MATERNO PELAS MÃOS COMPRIDAS E OS DEDOS SEGUROS DA MULHER-PARTEIRA.

PROFISSÃO DIVINA ESSA DE PRESCUTAR O INTERIOR DO CORPO E ERGUER À LUZ UM OUTRO CORPO QUE RECOMEÇA O CICLO.

NAS ERAS ANTIGAS O NASCER DUMA NOVA VIDA ERA UM RITUAL MÁGICO RODEADO DE FOGOS ESTRANHOS E VAPORES DE PLANTAS SAGRADAS E FORA DESSE ALTAR DO NASCIMENTO, RODEADAS DAS BRISAS DOS VALES OU DAS RAJADAS DE VENTO QUE DESCIAM DOS BOSQUES DAS MONTANHAS AS MULHERES DAS ALDEIAS REDOPIAVAM EM VOLTA DO FOGO SAGRADO.

O NASCER ERA A FALA DA MÃE-TERRA COM OS SEUS FILHOS.

NASCI EM NOVEMBRO, LÁ PARA OS FINAIS, NÃO SEI SE CHOVIA OU SE HAVIA JÁ UMA LUA LÍMPIDA ANUNCIANDO A NEVE.

NAS ERAS ANTIGAS OS MESES ERAM CADA UM DELES UM PORTAL SAGRADO, A VIA NATURAL QUE O HOMEM ATRAVESSAVA EM DIREÇÃO AO OUTRO LADO ONDE SE
REFORMULAVA - TALVEZ PARA RENASCER, QUEM SABE?

MAS CADA HOMEM SENTIA DENTRO DE SI A BÚSSOLA DA VIDA QUE O ORIENTAVA
DESDE QUE CONSEGUIA DISTINGUIR A PAI DA MÃE E AS FLORES  DO FUMO DAS LAREIRAS.

CADA HOMEM SENTIA QUE TINHA UM LUGAR FIXO ENTRE OUTROS HOMENS E DENTRO DA SUA ALMA TINHA INSCRITO O MAPA DA VIDA QUE ELE SEGUIA POR INSTINTO NATURAL.

TRABALHAR E ENTOAR CANÇÕES ANTIGAS, APAIXONAR-SE E JUNTAR O DEU DESTINO A UIM OUTRO DESTINO CUJA CABEÇA ESTAVA ADORNADA DE FLORES SILVESTRES ENQUANTO OS VIZINHOS ENTOAVAM CANTARES DE AUGÚRIOS FELIZES E FARTAS MESAS LIGAVAM AS FAMÍLIAS.

CADA HOMEM NÃO SENTIA A ANGÚSTIA DE NADA VALER NEM A ANGÚSTIA DE NÃO VER AO SEU LADO OS MESMOS VIZINHOS QUE COM ELE BRINCAVAM NAS ERAS FELIZES DOS SEUS PRIMEIROS TEMPOS.

A MORTE ERA RECONHECIDA COMO UM AMIGO QUE PARTIA PRIMEIRO E ESPERAVA PELOS OUTROS AMIGOS.

NÃO PODIAM PARTIR TODOS NO MESMO INSTANTE E DEIXANDO AS SEARAS POR CEIFAR, OS VINHEDOS POR PENTEAR E OS REBANHOS POR APASCENTAR.

NAS ERAS ANTIGAS HAVIA A ORDEM NATURAL QUE EMBALAVA A VIDA HUMANA
COMO SE A MÃE NATUREZA NOS TRANSPORTASSE  NAS SUAS MÃOS SAGRADAS.

NAS ERAS ANTIGAS NÃO HAVIA O CAOS E A ANGÚSTIA E A DESORDEM E O CHORO SILENCIOSO QUE COMO  HUMIDADE SINISTRA INVADE E CORRÓI NUM SILÊNCIO DE MORTE CADA CORPO, CADA LAR, CADA ALDEIA POR MAIOR QUE SEJA.

VIVEMOS NA ERA DA MORTIFICAÇÃO.

CADA CRIANÇA NÃO TEM DESTINO CERTO
CADA CASAL TEM MEDO DE ABRIR A PORTA DO LAR E UMA ARAGEM GELADA DE
INFORTÚNIO ABAFAR OS RISOS E APAGAR O FOGO DA VIDA.

AS NOVAS ALDEIAS GRANDES QUE O HOMEM DE HOJE CHAMA DE CIDADE SÃO TÚMULOS SEM TAMPA ONDE O HOMEM DESORIENTADO VAI PELAS SUAS PRÓPRIAS MÃOS DESCARNANDO O SEU PRÓPRIO CORPO, A SUA PRÓPRIA ALMA FINGINDO COM MIL DISFARCES QUE AINDA É O MESMO HOMEM DAS ERAS ANTIGAS.


MAS ESTE HOMEM DA ERA DA MORTIFICAÇÃO PERDEU A ALMA, PERDEU A HONRA
DO ANTIGO GUERREIRO E DO VELHO CAÇADOR.

JÁ NÃO É O HOMEM QUE ADORMECIA NAS MÃOS DA MÃE TERRA.

É UM ANIMAL ESTRANHO VÍTIMA DUMA DOENÇA ESTRANHA QUE LENTAMENTE O
CORRÓI ATÉ QUE ELE PRÓPRIO NÃO SE CONHEÇA A SI MESMO.

QUANDO O HOMEM SE FUNDIR DENTRO DA PRÓPRIA TERRA DESFEITO NUMA MASSA INFORME DE AMBIÇÃO E DE LOUCURA COLETIVA ENTÃO A TERRA MÃE TRANFORMARÁ ESSA MATÉRIA INERTE DE NOVO EM HÚMOS PARA QUE RENASÇAM
AS NOVAS PRADARIAS, PARA QUE SE REGENEREM TODAS AS ÁGUAS E AS TERRA
RESOIRE DE NOVO APENAS O AROMA DAS PLANTAS SILVESTRES.

O MEU NOVEMBRO. MÊS DE NASCIMENTO TERÁ PERDIDO O SEU NOME ANTIGO. APENAS HAVERÁ AS ERAS DAS PLANTAS E A ERA DAS NEVES.

NADA É IGUAL EM TODOS OS DIAS E OS DIAS DO HOMEM SÃO JÁ DIAS CURTOS.